segunda-feira, 30 de abril de 2012

Nada é de graça


Uma rápida espiada nos argumentos da promotoria e da defesa sobre as cotas e é notável o grau de comprometimento entre as partes, principalmente com a eloquência da defesa em relatar que as cotas são na verdade o pagamento de uma pequena parcela da dívida que o Brasil tem com a população negra. Durante a votação alguns indígenas foram expulsos à força do tribunal porque exigiam que fossem incluídos dentro das cotas, afinal de contas o Brasil não tem dívida com eles também? Mas isso é assunto para outra coluna, o que me faz digitar nada mais é do que o assunto principal, as cotas e quem paga a conta.

Voltando ao passado, quando ocorreu a ocupação de Portugal ao até então desconhecido Brasil já havia habitantes destas terras, os índios. Foram assim chamados porque, pelo que me ensinaram na escola, os portugueses achavam que haviam chegado às índias. Depois de notarem que não estavam nas índias, decidiram manter o erro e não deram novo nome e este povo. Pra quê fazer isso, ninguém estava lá para se importar com essa questão. 

Depois vieram os negros, escravos, muitos e muitos mortos nas galerias dos navios negreiros, tanto de fome quanto de doenças. Doenças estas que não deveriam existir nas novas terras, mas como ela estava sendo ocupada, nada mais justo, do que trazer toda a bagagem da Europa para o novo continente. Muitos outros negros morreram tentando encontrar a liberdade e, de uma forma ou de outra, encontraram.

Após a abolição da escravatura os negros decidiram que não mais trabalhariam nas lavouras que tanto sofrimento trouxe ao seu povo, assim sendo, os portugueses trouxeram os italianos, alemães, açorianos e outros povos vieram de arrasto para o novo mundo. Detalhe, alguns destes povos também sofreram no regime imperialista com o trabalho escravo. Não com correntes, mas ficaram presos aos senhorios das fazendas com dívidas imensas e sem poder recorrer a ninguém. Não me lembro de existirem embaixadas naquela época e muito menos acordos bilaterais de comércio. Neste ponto o Brasil já estava andando com as próprias pernas (dos outros).

Séculos de história mostram um Brasil sanguinário, injusto com muitos povos, lutas desiguais, abusos de poder e autoridade, escândalos políticos, revoltas... o que é justo no Brasil? Quais são as verdadeiras dívidas do Brasil com os povos e com o seu povo? Não seria na verdade de Portugal a dívida original com os negros e índios? Que tipo de dívida será paga com o uso de cotas e bolsa-tudo-que-puder-ser-dado-para-ganhar-as-eleições? E o mais importante, quem está pagando as dívidas estas mencionadas? Quem é o Brasil!?

Eis a questão, ninguém está pagando coisa alguma! Sério. Todos estão pagando impostos, todos são assaltados, todos estão olhando o Jornal da Globo mostrando mais uma CPI que possivelmente vai dar em nada, todos estão reclamando, todos menos um seleto grupo de pessoas: os políticos de carreira. Todos os dias estão pagando dívidas uns dos outros, mas não estas dívidas históricas que alegam ser nossa responsabilidade. Essa dívida não existe, porque quem executou as ações passadas já não está aqui para respondê-las. É como cobrar a conta de um morto sem parentes e alegar que a culpa é do coveiro, porque foi o último a ter contato com o falecido.

As tais cotas não passam de placebo, pois o governo insiste em apagar chamas e ignora o foco do incêndio, o falho sistema de ensino público. Quais os motivos dos alunos de escolas públicas não conseguirem entrar na faculdade? São vários, nem vou citar, mas uma coisa é certa, há alunos que conseguem. O que estes alunos fizeram de diferente para conquistar essa vaga sem o uso de cotas? Dedicação, comprometimento, foco. Acredito que estes que conseguem não estão pensando em se tornar profissionais das passarelas ou jogadores de futebol, eles devem ter um objetivo na vida. Pode ser esta a solução, direcionar as crianças, antes mesmo da escola, para um objetivo de vida. Ensinar a respeitar os mais velhos os professores e as leis. Muitos professores perdem a vontade de ensinar, ou desistem e viram zumbis, porque não estão vendo os frutos do seu trabalho nas suas turmas. Salário melhor, mais recursos, isso é importante, mas não só isso. De que adianta uma Ferrari se vai andar nas estradas de chão do interior em dia de chuva?

Não precisamos de cotas, precisamos é ter um sistema de ensino público tão bom quanto das escolas particulares. Precisamos que o povo tenha educação de qualidade dentro de casa, que comece pelos pais. Precisamos olhar para o próprio rabo antes de sair criticando o dos outros e deixar de ficar reclamando e começar a agir. Conforme proferido por um dos ministros do STF as cotas são constitucionais, porém “não devem existir para sempre”. E o que limita o para sempre? Somos nós.

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